segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Você não me faz bem

"Fique mais, que eu gostei de ter você. Não vou mais querer ninguém, agora que sei..." é o que me vem à mente ao saber seu contato não existe mais no meu celular. Fui eu que apaguei ou você que me bloqueou? Ingenuidade minha, eu sei, pensar que isso te incomodaria. Mas, quem sabe, você não está apaixonado por alguém e quer que dê certo e resolveu apagar os fracassos anteriores. Eu mesma me dilacerei tantas vezes e recusei o bálsamo tantas outras, que já nem sei o que sou: ferida ou unguento. Mesmo assim, peço a quem quer que reja o Universo que cuide de você e te abra os caminhos. Peço com tanta força e vontade para que você seja feliz, que, por segundos, sinto o peito arder um calor sacro de pedido realizado com sucesso. Minha mente vaga em busca da sua, minhas mãos querem somente o calor das suas mãos e meu sexo, ah! deixa quieto! No que eu te tornei? Quantos mantos ideais tive que sobrepor para encobrir seus pés de barro? E com quantas águas lavei seu coração amarelo para que, ao menos, sonhasse com teu beijo? Seus olhos me perseguem na esquina de meus olhos, sempre inquisitivos, certeiros, sem nada a perder e, então... Tudo muda! Vejo você a me encarar com olhos suplicantes, doces... qual palavra eu nunca te disse e estava sempre em minhas ações? Qual palavra, meu Deus, você sonhou que saísse de meus lábios, mas eu nunca ousei pensá-la? Por ser tua mente meu templo e teus olhos o deus que me guiou para fora do labirinto, sem novelo, sem minotauro, seu Teseu. Estou aqui, quase serva, morta-viva, a esperar mais uma vez teu comando para invadir, dominar e destruir - o que, senão a mim mesmo? Você não me faz bem e te amo por isso, pelo verso mal compreendido de Clarice e os tantos versos declamados de Drummond - hino à realidade. Te amo e sempre te amarei porque foi a sua mão que negou a corda, que se recusou a caminhar lado a lado. Te amo porque me provou humana e egoísta, porque soube me ensinar a prestar atenção. Não se vá! Não me deixe só, pois tenho medo do escuro. Tenho medo dos fantasmas de minha voz - sendo você o que mais fala por meus lábios, o que mais pensa em minha mente e o que mais age em minhas mãos. Você, meu doce fantasma, que morreu há anos, e ainda te carrego colado no corpo, na tentativa de me ajudar a encontrar o tesouro. Mal sei eu que apodreço junto a você. Você morto e eu devorando os vermes que primeiro devoraram sua pele. Me alimento de ti? Serei o verme? Serei eu o fantasma?

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Outro fim para um outro começo

Os últimos dias me asfixiam. Duas mãos grandes e apodrecidas me seguram pelo pescoço, forçam meu rosto para aquilo que finjo esquecer. Viajo em desespero para qualquer canto, me escondo dentro de qualquer abraço, mas entre um gemido e outro, vejo se aproximar mãos, olhos e boca. Algumas frases se descolam de minha pele e mais uma vez me aprisiono. Sua voz me afaga gentil e suave e me entrego às suas mãos frias e suadas. Qualquer palavra é gatilho apontado sob o queixo, qualquer descuido e me vejo em seu quarto, mexendo em caixa de sapato (tesouro velado). Creio que meu cansaço vem de vasculhar incessantemente cada dobra do blusão, para deixar ir verso, beijo ou fio de cabelo, vem do cuidado em não perceber as palavras se soltando lentamente, pêlo em flor desabrochada. Palavras suas, no seu tom de voz, no qual sou ninada antes de dormir, ao acordar, durante o banho e enquanto passeio pela cidade. Se algum dia chegarmos a conversar, me conta de novo suas aventuras com seu pai -- você me contou só uma vez, mas me pareceram legais.
Todo esse desabafo, esses posts sem sentido, são sempre a água podre que tiro do peito para não morrer afogada. Eu gostaria que meu coração estivesse do lado de fora, ou que fosse um blue bird fugitivo, ou até mesmo, forte e vigoroso, mas ele é mole, se doa a quem lhe oferece qualquer migalha de atenção. Ele escorreu para o mais fundo das minhas minas, cujas pedras preciosas já foram todas roubadas. Teria, por acaso, pensado ele, que poderia preencher todo o espaço vazio? Mas lá no fundo, mina água, vinda das lágrimas choradas por dentro e das feridas pusorentas e nunca cicatrizadas. Lá, meu coração-geléia se encharcou dessa substância tóxica e dela se viciou em tristeza. Ele soube ocupar todos espaços, borrando tudo de lilás e gris. Meu mole coração me incentiva a continuar a caminhada, mas cotidianamente escorrem duas ou três lágrimas de D. e ele se vê molhado por amor, na sua forma mais pura. Meu coração sorri e, por alguns minutos, se considera feliz.