sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Tem sido um ano longo, muito longo, para tão poucas alegrias e comoções, mas quando essas acontecem, meu Deus!, como ficam felizes os meus olhos e como é fácil sorrir novamente... Há tempos não digo nada que cause prazer ou dor, caro amigo, e mesmo assim, sinto como se tudo estivesse exposto com notas explicativas no mural do meu velho coração. Engraçado, tenho olhos cansados e um coração velho, o que mais posso querer? É mesmo, me faltam mãos trêmulas para que o que for pesado no chão caia e nunca mais volte a ocupar o espaço oco das mãos.
Não espere que dos meus olhos tropecem lágrimas desordeiras e embriagadas de dor. O ano chega ao seu fim, mas meu peito de pedra que nada sente e nada ama não se permite se desprender de seu musgo, tão caro e raro. Mas o outro, o que morre e chora, tem nome, Madeleine Wallace, e sussurra, hoje, melodias fúnebres e fados desengranhados. Meu peito duro nada sabe da certeza aguda que me aponta nos rins e sobe, sobe, até a boca de que serei feliz, um dia; de que realizarei milhões de pequeninos sonhos outra vez. E só.
Não me explicaram o que buscar depois da felicidade, você sabe? Temo haver um abismo, como nas piores previsões de Colombo, entre mim e a Terra Prometida, pois pode haver monstros devoradores de almas e dragões que cospem diamantes. E o que será de mim, sozinha novamente?
A insônia se senta ao meu lado na cama, tento ignorá-la, mas as coisas que, de madrugada, segreda me fazem pensar se não seria melhor entrar em coma ou dormir de uma vez por todas, pois são terríveis os amores fracassados e os corações partidos em mil...
Espero do ano que vem que eu viva de doces mentiras...

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

A Heloisa Medeiros, de Graciliano Ramos

Heloisa
chegaram-me as duas linhas e meia que me escreveste. Pareceram-me feitas por uma senhora muito séria, muito séria!, muito antiga, muito devota, dessas que deitam água-benta na tinta.
Tanta gravidade, tanta medida, só vejo em documentos oficiais. Até sinto desejo de começar esta carta assim: 'Exma. Sra.: tenho a honra de comunicar a V. Exa., etc.' Onze palavras! Imaginas o que um indivíduo experimenta ao receber onze palavras frias da criatura que lhe tira o sono? Não imaginas. E sabes o que vem a ser isto de passar horas da noite acordado, sonhando coisas absurdas? Não sabes. Pois eu te conto.
Sento-me à banca, levado por um velho hábito, olho com rancor uma folha de papel, que teima em conservar-se branca, penso que o Natal é uma festa deliciosa. Os bazares, a delegacia de polícia, a procissão da Nossa Senhora do Amparo... E depois o jogo dos disparates, exelente jogo. 'Iaiá caiu no poço'. Ora o poço! Quem caiu no poço fui eu.
Principio uma carta que deveria ter sido escrita há três meses, não posso concluí-la. Fumo cigarros sem conta, olhando um livro aberto, que não leio. Dança-me na cabeça uma chusma de ideias desencontradas. Entre elas, tenaz, surge a lembrança de uma criaturinha a uem eu disse aqui em casa, depois da prisão o vigário, nem sei ue tolices.
Apaga-se a luz, deito-me. O sono anda longe. Que vieste fazer em Palmeira? Por que não te deixaste ficar onde estavas?
Não consigo dormir. O nordeste, lá fora, varre os telhados. Na escuridão vejo indistintamente essa mancha que tens no olho direito e penso em certa conversa de cinco minutos, à janela do reverendo. Por que me falaste daquela forma? Desejei que o teto caísse e nos matasse a todos.
Andei criando fantasmas. Vi dentro de mim outra muito diferente da que encontrei nauele dia.
Por que me quiseste? Deram-te conselhos? Por que apareceste mudada em vinte e quatro horas? Eu te procurei porque endoideci por tua causaquando te vi pela primeira vez.
É necessário que isto acabe logo. Tenho raiva de ti, meu amor.
Fui visitar o padre Macedo. Falou-me de ti, mas o que disse foi vago, confuso, diante de dez pessoas. É triste que, para ter notícias tuas, minha filha, eu as ouça em público. Foram minhas irmãs que me disseram o dia de teu aniversário e me deram teu endereço.
Tinhas razão quando afirmaste que entre nós não havia nada. Muito me fazes sofrer.
É preciso que tenhas confiança em mim, que me escrevas cartas extensas, que me abras largamente as portas da tua alma.
Beijo-te as mãos, meu amor.
Recomendo-me aos teus, com especialidade a dona Lili, que vai ser minha sogra, diz a ela. Acho-a boa demais para sogra.
Amo-te muito. Espero que venhas a gostar de mim um pouco. Teu Graciliano. Palmeira, 16 de janeiro de 1928.


segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Fim

Cheguei ao fim de outubro com um gosto amargo de quem deixou muita coisa por fazer, no meu caso, por refletir. Este seria o mês em que poria minha vida na balança e decidiria o que mudar e para onde seguir. Não aconteceu nada disso, fugi de mim como alguém que foge de um amor frustrado...
Agora novembro chega ao fim, e uma estranha alegria me invade, dessas sem nome e sem forma, sem ter razão no amor ou na realização pessoal/ profissional, não sei de onde vem. E não, não tem nada a ver com a chegada do Papai Noel no parkshopping.
Minha vida não é mais o rubro inferno que eu pintava, meu Deus!, como me deixei levar por meus sentimento medíocres e inválidos... não sei mais andar. Sempre prometemos mudar, sempre nos decepcionamos... minha ilusão me provoca, hoje, indiferença. O que fazer?? Twitter, face, google +, nada, nada, nada...
O mar de minha vida ficou calmo de repente, susto!
Minhas mãos tremem incansavelmente, temem o destino das coisas que nelas morrem. Tudo morre, tudo vai, e eu fico, sem graça por ter quebrado mais um (e talvez este fosse único... quebrei-o sem preceber).
Me canso por lágrimas que não chorarei, por frases incompletas e por dores meio-sofridas. Agora!! Meu amigo me espera para morrermos em um beijo. Envenenado? Não. De amor.
Serei amada um dia? Não quero pensar nisso agora, me desculpe. Qual seu maior sonho? Este não digo, pois se virará contra mim. Onde andará seu amor? Joguei-o a quem passava na doce esperança de ser apanhado por qualquer um, hoje não sei por onde anda, ou se anda, deve estar pisoteado por aquele por quem meus olhos se lavaram há tempos.

Mundo, mundo, vasto mundo...


Me carregue no esquecimento...


Melquíades voltou da morte por não aguentar a solidão...


O sol dos meus quinze anos morreu sem que eu o percebesse...


Agnes

terça-feira, 25 de outubro de 2011

sábado, 8 de outubro de 2011

Canção para uma valsa lenta, Mário Quintana


Minha vida não foi um romance…

Nunca tive até hoje um segredo.

Se me amar, não digas, que morro

De surpresa… de encanto… de medo…

Minha vida não foi um romance

Minha vida passou por passar

Se não amas, não finjas, que vivo

Esperando um amor para amar.

Minha vida não foi um romance…

Pobre vida… passou sem enredo…

Glória a ti que me enches de vida

De surpresa, de encanto, de medo!

Minha vida não foi um romance…

Ai de mim… Já se ia acabar!

Traduzir-se, de Ferreira Gullar

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?


De Na Vertigem do Dia (1975-1980)


Ferreira Gullar me deixa lágrimas nos olhos... e também porque é Outubro...

Vlog de Velho

Seu Fernando dispensa apresentações...




Um Dia...

"Um dia descobrimos que beijar uma pessoa para esquecer outra, é bobagem.
Você não só não esquece a outra pessoa como pensa muito mais nela…
Um dia nós percebemos que as mulheres tem extinto “caçador” e fazem qualquer homem sofrer…
Um dia descobrimos que se apaixonar é inevitável…
Um dia percebemos que as melhores provas de amor são as mais simples…
Um dia percebemos que o comum não nos atrai…
um dia saberemos que ser classificado como “bonzinho” não é bom…
Um dia percebemos que a pessoa que nunca te liga é a que mais pensa em você…
Um dia saberemos a importância da frase ” Tu se tornas eternamente responsável por aquilo que cativas…”
Um dia percebemos que somos muito importante para alguém mas não damos valor a isso…
Um dia percebemos como aquele amigo faz falta, mas ai já é tarde demais…
Enfim… um dia descobrimos que apesar de viver quase 1 século esse tempo todo não é suficiente para realizarmos todos que os nossos sonhos, para beijarmos todas as bocas que nos atraem, para dizer tudo o que tem que ser dito…
O jeito é: ou nos conformarmos com a falta de algumas coisas na nossa vida ou lutarmos para realizar todas as nossas loucuras…
Quem não compreender um olhar tampouco compreenderá uma longa explicação".

Mario Quintana.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

PROPOSTA

NEOLIBERALISMO: a partir da década de 1960, passou a significar a doutrina econômica que defende a absoluta liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre a economia, só devendo esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim num grau mínimo (minarquia).

PROPOSTA: eu, Estado-Maior de mim mesma, decido me privatizar. Com tal fim, abro um concurso licitatório para quem quiser me "comprar".

CONCURSO: pelo que vc me compraria? (não serão aceitas propostas que envolvam quantias em dinheiro e anéis de diamantes rsrsrs)
Participa! A proposta mais criativa e que mais me encantar ganhará o prazer de viver o que propôs comigo... Ah, tb não vale safadeza, tah?

Paixão, Simone

Amo tua voz e tua cor
E teu jeito de fazer amor
Revirando os olhos e o tapete
Suspirando em falsete
Coisas que eu nem sei contar
Ser feliz é tudo que se quer
Ah! Esse maldito fechecler
De repente a gente rasga a roupa
E uma febre muito louca
Faz o corpo arrepiar
Depois do terceiro ou quarto copo
Tudo que vier eu topo
Tudo que vier, vem bem
Quando bebo perco o juízo
Não me responsabilizo
Nem por mim, nem por ninguém

Não quero ficar na tua vida
Como uma paixão mal resolvida
Dessas que a gente tem ciúme
E se encharca de perfume
Faz que tenta se matar
Vou ficar até o fim do dia
Decorando tua geografia
E essa aventura em carne e osso
Deixa marcas no pescoço
Faz a gente levitar
Tens um não sei que de paraíso
E o corpo mais preciso
Do que o mais lindo dos mortais
Tens uma beleza infinita
E a boca mais bonita
Que a minha já tocou...

Tava ouvindo essa música ontem enquanto lia suas poesias... umas aí de milhões de anos atrás, qnd ainda acreditávamos no AMOR, vc se lembra?

O mês de Outubro está chegando e com ele minhas esquisitices afloram...

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

dia 26 de setembro de 2011

A cena foi engraçada, pelo menos para mim, que ri muito. Foi assim: eram quase oito horas da manhã, eu estava desesperada na parada porque meu ônibus não tinha passado e eu teria aula cedo. Finalmente, passou um L2 norte. Do outro lado do mundo, um menino esperava um ônibus para algum lugar, provavelmente para o Plano também. O meu ônibus passou na parada que ele estava e, como despertada de um sonho, vi que ele procurava alguém. Somente nesse momento, percebi que eu também procurava alguém, uma pessoa que eu sempre procuro, mas nunca encontro, já que nunca sei ao certo a parada que essa pessoa espera o ônibus. Você procurou em vão, porque eu estava num dos últimos bancos, mas eu te vi. "Olha, Agnes, o André!!", pensei paralisada. Agora sei sua parada, apesar de ela ser igual a todas as outras.

domingo, 25 de setembro de 2011

Estou de volta!!!!



Então, me divirto tanto com seus vídeos... vejo e revejo, sempre com um sorrisão estampado no rosto.
Não tenho o dom de encontrar vídeos assim, nem, muito menos, de fazê-los, por isso, fico com a poesia que me move:

NAO SER
Quem me dera voltar à inocência
Das coisas brutas, sãs, inanimadas,
Despir o vão orgulho, a incoerência:
- Mantos rotos de estátuas mutiladas!

Ah! Arrancar às carnes laceradas
Seu mísero segredo de consciência!
Ah! Poder ser apenas florescência
De astros em puras noites deslumbradas!

Ser nostálgico choupo ao entardecer,
De ramos graves, plácidos, absortos
Na mágica tarefa de viver!

Ser haste, seiva, ramaria inquieta,
Erguer ao sol o coração dos mortos
Na urna de oiro de uma flor aberta!...

Florbela Espanca

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Aliens

Olha eu de novo com meus vídeos. E fico me indagando como a história desse vídeo o quanto a humanidade seria melhor se o homem ao invés criar guerra para impor suas cores e bandeira, buscasse trabalhar em conjunto para criar um mundo único.

Chega de conversa e assista:

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Meu Emprego

Fico feliz que tenha se lembrado de mim para essa reunião, mas felizmente já tenho um emprego muito bom. Que ganho relativamente bem para a minha idade...

Desta  vez vou passar essa oportunidade para alguém que de fato necessita. E também tenho uma reunião de um projeto meu após o expediente.

Você está no Facebook?

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Amanhã Será?




Amanhã será um novo dia? Será que amanhã amanhecerá?

O Fato é

O fato é que seu não parar na frente do computador para escrever nem que seja uma linha sem fim ou pontos ortográfico que deem o sentido de pausa ou simplesmente aquele momento que nos fazem respirar tomar fôlego e prosseguir adiante sei que não escreverei nada pois sempre que nós paramos nossas vidas com pontos não ortograficos pois nossas vidas não são como os textos que hoje começamos mas amanhã podemos continuá-los de onde pausamos temos que continuar e prosseguir sempre sem pausas suspiros profundos e escrever um texto sem suspiros profundo que a pontuação nos obriga a fazer mostra o quão difícil é na vida parar um pouco para respirar e pensar no que está a nossa volta será que somos capazes de olhar para o lado e ver que há alguém que não está bem a ponto de dar seu último suspiro e colocar um ponto final a sua vida será que nós somos capazes de olhar no espelho e ver que NÓS somos essa pessoa sinceramente não sei então prefiro continuar a escrever sobre qualquer coisa como a vida é sem dar chance de ser esse o meu último suspiro que porá fim a minha vida e a tudo que já vivi, sinto que meu pulmão já não puxa mais o ar com a alguns minutos atrás, nossa, só agora percebia que comecei a pontar o meu texto e isso é o que está consumindo minhas pausas, meus suspiros e minha vid.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

A CASA DE ASTÉRION (Jorge Luis Borges)


E a rainha deu à luz um filho

Que se chamou Astérion.

APOLODORO: Biblioteca, III, I



Sei que me acusam de soberba, e talvez de misantropia, e talvez de loucura. Tais acusações (que castigarei ao seu devido tempo) são irrisórias. É verdade que não saio de minha casa, mas também é verdade que suas portas (cujo número é infinito*) estão abertas dia e noite aos homens e também aos animais. Que entre quem quiser. Não encontrará aqui pompas feminis nem o bizarro aparato dos palácios, mas sim a quietude e a solidão. Assim, encontrará uma casa como não há outra na face da Terra. (Mentem os que declaram que no Egito existe uma parecida). Até meus detratores admitem que não há um só móvel na casa. Outra história ridícula é que eu, Astérion, sou um prisioneiro. Repetirei que não há uma porta fechada, acrescentarei que não há uma fechadura? Além disso, num entardecer pisei a rua; se antes da noite voltei, fiz isso pelo temor que me infundiram os rostos da plebe, rostos descoloridos e achatados, como a mão aberta. Já se havia posto o sol, mas o desvalido choro de uma criança e as toscas preces da grei disseram que me haviam reconhecido. O povo orava, fugia, prosternava-se; alguns trepavam na estilóbata do templo dos Machados, outros juntavam pedras. Algum, creio, ocultou-se sob o mar. Não em vão foi uma rainha minha mãe; não posso confundir-me com o vulgo, ainda que minha modéstia o queira.

O Fato é que sou único. Não me interessa o que um homem possa transmitir a outros homens; como o filósofo, penso que nada é comunicável pela arte da escritura. As maçantes e triviais minúcias não têm espaço em meu espírito, que está capacitado para o grande; jamais reti a diferença entre uma letra e outra. Certa impaciência generosa não consentiu que eu aprendesse a ler. Às vezes o deploro, porque as noites e os dias são longos.

Claro que não me faltam distrações. Igual ao carneiro que vai investir, corro pelas galerias de pedra até rolar no chão, nauseado. Escondo-me à sombra de uma cisterna ou à volta de um corredor e finjo que me procuram. Existem terraços de onde me deixo cair até me ensangüentar. A qualquer hora posso fingir que estou adormecido, com os olhos fechados e a respiração poderosa. (Às vezes durmo realmente, às vezes está mudada a cor do dia quando abro os olhos.) Mas, de tantas brincadeiras, a que prefiro é a do outro Astérion. Finjo que vem visitar-me e que lhe mostro a casa. Com grandes reverências, digo-lhe: Agora voltamos à encruzilhada anterior ou Agora desembocamos em outro pátio ou Bem dizia eu que te agradaria o canalete ou Agora verás uma cisterna que se encheu de areia ou Já verás como o porão se bifurca. Às vezes me confundo e nos rimos agradavelmente os dois.

Não só tenho imaginado esses jogos; também tenho meditado sobre a casa. Todas as partes da casa existem muitas vezes, qualquer lugar é outro lugar. Não há uma cisterna, um pátio, um bebedouro, uma manjedoura; são quatorze [são infinitos] as manjedouras, bebedouros, pátios, cisternas. A casa é do tamanho do mundo; ou melhor, é o mundo. Contudo, à força de se fatigar em pátios com uma cisterna e poeirentas galerias de pedra cinza, alcancei a rua e vi o templo dos Machados e o mar. Não entendi isso até que uma visão da noite me revelou que também são quatorze [são infinitos] os mares e os templos. Tudo existe muitas vezes, quatorze vezes, mas duas coisas há no mundo que parecem existir uma só vez: acima, o intrincado Sol; abaixo, Astérion. Talvez eu tenha criado as estrelas e o Sol e a enorme casa, mas já não me recordo.

A cada nove anos entram na casa nove homens para que eu os liberte de todo mal. Ouço seus passos e sua voz no fundo das galerias de pedra e corro alegremente a procurá-los. A cerimônia dura poucos minutos. Um após outro caem sem que eu ensangüente as mãos. Onde caíram ficam, e os cadáveres ajudam a distinguir uma galeria das outras. Ignoro quem são, mas sei que um deles profetizou, na hora de sua morte, que algum dia chegaria o meu redentor. Desde então não me dói a solidão, porque sei que vive meu redentor e no fim se levantará sobre o pó. Se meu ouvido alcançasse todos os rumores do mundo, eu perceberia seus passos. Oxalá que me leve a um lugar com menos galerias e menos portas. Como será meu redentor? pergunto-me. Será um touro ou um homem? Será talvez um touro com rosto de homem? Ou será como eu?

O sol da manhã reverberou na espada de bronze. Já não havia nenhum vestígio de sangue.

– Acreditarás, Ariadne? – disse Teseu –. O minotauro apenas se defendeu.

À Marta Mosquera Eastman

*O original diz catorze, mas sobram motivos para inferir que, na boca de Astérion, esse adjetivo numeral vale por infinitos. (N. do A.)
(Tradução de Marcelo Bueno de Paula)

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Chico Buarque- Bom Conselho

Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança
Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar
Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Nunca- A Banda Mais Bonita da Cidade

Nunca diga não pra mim
eu não vou poder trabalhar, conversar, descansar sem o teu sim
seja sempre assim
por favor me dê um sinal
um cartão postal, um aval dizendo assim
'não, não é o fim, dure o tempo que você gostar de mim
entre o não e o sim, só me deixe quando o lado bom for menor do que o ruim'
Nunca se esconda assim
eu não vou saber te falar, te explicar que eu também me assusto muito

você nunca vê que eu sou só um menino destes tais
que pensam demais
logo mais, vou correr atrás de ti.
'não, não é o fim, dure o tempo que você gostar de mim
entre o não e o sim, só me deixe quando o lado bom for menor do que o ruim'

(A propósito, a nova do Teatro é lindaaa!!!)

terça-feira, 2 de agosto de 2011

CARINHOSO, Pixinguinha

Meu coração, não sei por que
Bate feliz quando te vê
E os meus olhos ficam sorrindo
E pelas ruas vão te seguindo
Mas mesmo assim
Foges de mim

Ah se tu soubesses como sou tão carinhosa
E o muito, muito que te quero
E como é sincero o meu amor
Eu sei que tu não fugirias mais de mim

Vem, vem, vem, vem
Vem sentir o calor dos lábios meus a procura dos teus
Vem matar essa paixão que me devora o coração
E só assim então serei feliz
Bem feliz

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Vês, amiga, se não é Dom Quixote de la Mancha!

à minha querida Guinha

Vês, amiga, logo ali, se não é Dom Quixote de la Mancha a galopar imponente pelas ruas engarrafadas da cidade! Eu o vejo com os olhos marejados e ainda encharcados de sono; nesta triste manhã de julho, debruçado na janela, o sol desponta com uma pungente promessa de esperança: lá está o bravíssimo cavaleiro, acompanhado pelo seu fiel escudeiro Sancho Pança, trazendo às pessoas desiludidas da cidade palavras de boa-venturança, saudando às coisas da natureza, saudando o sol, a lua, os desertos, as estrelas, o ditoso céu, a ditosa idade, os imensos caminhos que se abrem ante vossos olhos, abençoados pela boa aurora!
E eu vejo você amiga, o seu mundo, suas coisas, suas fastidiosas obrigações cotidianas, seus estudos, sua vida enclausurada entre muros mal rebocados e letreiros comerciais de péssimo gosto; você lamenta não ter uma janela voltada para o sol, queria vê-lo nascer; mas se contenta quando é chegada a hora de crepúsculo e teus olhos fitam um sol pousando entre fios, antenas e casinhas térreas. É nessa hora que tua áspera cidade, de cores tão cruas, ganha uma tonalidade rósea e o céu inteiro parece se tingir com cores de uma melancólica despedida...

E você me pergunta numa carta: "... eu tenho uma casa, uma mamãe, comida na mesa... como posso me sentir infeliz?"
E você tem os olhos voltados para o crepúsculo... Nessas horas o seu mundo, tantas vezes sem sentido, parece ficar pequenino, doce, espiritual, e te convida à deliciosas viagens sobre um cavalo amigo... É possível vê-lo, ali, amplo cavalo selvagem galopando sobre nuvens encharcadas de luz. Ele galopa, galopa, sobre ele um cavaleiro... é Dom Quixote de la Mancha - Eu o vejo, amiga, ali, logo ali, o cavaleiro; será acaso você a triste donzela? ele te salvará? depressa cavaleiro! depressa! ele vem vindo em nossa direção, galopando furiosamente sobre as nuvens, elas se retorcem, se deformam, cercam o cavaleiro de moinhos, são seis, sete, oito... Serão dez? Não! Doze Moinhos de Vento!
O sol vertiginosamente desponta ao longe, mergulha atrás das casas, parece sugar consigo seus últimos despojos de luz, recolhe as últimas tintas que ficaram sobre os telhados, mas seus últimos despojos ainda iluminam cavalo e cavaleiro; eles se contorcem furiosamente por entre os moinhos, e todas as coisas se confundem, o cavaleiro saca sua lança, o silêncio da batalha é apavorante, o cavaleiro tomba; caem, cavalo e cavaleiro; cavalo e cavaleiro se dissipam; resistem os moinhos de vento...

E como uma metáfora da triste condição humana, todos os seus sonhos parecem tombar sobre as nuvens, sem produzir o menor ruído, desabam; e então amiga, tua esperança maltratada, cicatrizada pelas batalhas, pelas paredes mal rebocadas, tão cansada de esperar pela ditosa idade, pelos ditosos séculos professados pelo cavaleiro, descansa, silenciosamente tua esperança descansa, quando a noite vem e a lua dorme sobre as casas...


Por Alex Canuto em http://www.recantodasletras.com.br/autor.php?id=29784

domingo, 24 de julho de 2011

Fui ao Rio...

Estive no Rio até ontem à noite. Sem celular, sem net; somente eu, o mar e algumas tristezas. Por conta desse meu isolamento, talvez tenha desgastado e muito a metade da alma de um carinha aí... tirando isso, o Rio é lindo...!!!! (quase não resisto aos encantos da Cidade Maravilhosa...)
Além da água geladíssima do mar, descobri que tudo lá envolve o duplo sentido da vida, o q me aterrorizou um pouco, mas depois me acostumei d boas... ^^
Gostei dos seu videos, na verdade, todos para quem os mostrei riram à beça, menos o do de amor, q foi triste, confesso... mas valeu ;)
Do tipo de animação, gosto de 'Max & Mary, uma amizade diferente', apesar de ter conseguido assistir só pelo youtube "(
Ah... ir pro Rio foi bom, mas voltar para casa foi melhor ainda...
=D
Tamu na área!!

http://www.youtube.com/watch?v=KPULUwu0Wm8

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Meus Vídeos

Se tem coisa que gosto é de imagen. E vídeos se enquadram nisso. Tenho vários vídeos com várias histórias, vários lugares e que me cativam de várias formas.

Outra coisa que gosto também, não saindo de imagens também, são fotos, tenho várias, mas essas não posso publicar aqui já que muitas são para maiores de idade. Muitas são de meninas tatuadas em poses sensuais, minhas paixões... Ainda farei uma tatuagem, me tornar definitivamente a ovelha negra da familia, espero que isso aconteça logo...

Não sei se você sente a mesma coisa que eu a escrever. Sinto como se estivesse aqui comigo ou em algum lugar e conversamos um olhando para o outro, com aquelas trocas de olhares meio tímidas e sem jeito... Chega de falar demais ao pé do ouvido, deixe que eu mostre um pouco de mim...



Uma histórinha para fazer rir...



Uma histórinha para fazer cara de espanto



Uma musiquinha para terminar...

Mil Palavras

Quantas vezes ao longo do dia nos deparamos com oportunidades, seja para olhar para alguém ou sorrir para esse alguém?

Quantas vezes alguém perde a oportunidade de olhar para nós ou simplesmente sorri?

Não sei quantas oportunidades já perdi de dizer um Bom Dia para alguém, de sorrir para uma pessoa no ônibus, ou simplesmente olhar para o céu azul pela janela do ônibus enquanto vou para o trabalho. São muitos momentos que perdemos ao longo do dia que nem mil palavras poderiam expressar o que se passou e, acredito que ainda haveram tantos outros momentos que perderei até encontrar as minhas mil palavras...

Acho que esse vídeo expressa um pouco das várias oportunidades que perdemos e tentamos correr atrás depois que perdemos uma chance num dia...




P.S.: Já assisti esse vídeo N vezes... É um dos meus preferidos, dúvido não de identificar com a história.
P.S.²: Acredito que agora terei mais tempo para escrever, terminei meu TCC e estou nos finalmentes da facul, mesmo não me formando agora, mas isso é história para se contar mais para frente.

MoSaIcO

Li, reli, trili seu texto, sempre com lágrimas nos olhos. Estranho vc usar a palavra "abandonar", porque nunca quis abandonar ninguém nessa minha caminhada, e tento não fazê-lo. Bonito, extremamente bonito é saber que deixamos passar, mas, nem por isso, não carregamos em nossas memórias, e quem sabe no esquecimento?, fatos marcantes. Vc, meu primeiro namoradinho, meu grande amigo, um ninho que me abrigou por algum tempo... Sim, sou metáforas. A vida é uma metáfora desafiadora ("desvenda-me ou devoro-te"), pena muitas pessoas morrerem sem perceber a charada em sua frente. Eu percebi a minha e não dizê-la com palavras. Tento respeitar aqueles que estão ao meu lado, amar-lhes o silêncio da partida e a atonicidade da chegada, assim, sem mais nem menos... mas, sabe, não me entrego... aquela parte que é só minha, essa ninguém ainda conseguiu tocar. Me disseram um dia desses: "pra vc é tão fácil tirar a roupa...", mas a capa da minha ferida continua intocada, e meu coração necrosa por excesso de amor... continuo de roupa, mesmo nua. Isso, não há quem veja, não há quem queira ver, porque ficar sem máscaras na frente do outro é a morte. Dos ideais, dos sonhos, daquilo tudo que te rege; é estar vulnerável a todo e qualquer ataque. É muito bom saber que vc está por perto. (a imagem diz tudo, e vc soube escolhê-la com maestria.) Apesar de todas as pessoas que conheço, e de todos os amores que tento viver, me sinto só o tempo todo. Como quem tem um machucado e fica arrancando a casquinha da cicatrização com uma concentração de fazer inveja a muito monge, assim sou eu encurvada para dentro de mim, um caracol que se conforma a sua concha.
Vc se lembra da tartaruga Tuchê? Ela atendia o telefone que tocava dentro da sua carapaça... eu sempre me perguntava: "quem será que conhece realmente todas as coisas que o Tuchê traz dentro de si?" (é obvio que com outras palavras...). E não é isso o amor? Escancarar as janelas da alma e fazer com que o sol invada cada canto por meio de outro? Engenheiros me lembra, entretanto, que toda luz produz sombra. E, mesmo esta, não seria a mudança contínua que acompanha nossa vida? Não sei mais o que é isso que digo... mas a vida é um rio e estamos no meio dele, aparando com as mãos aquilo que vem da fonte; não podemos segurar nada, apenas sentir sua textura, viver a coisa que vem desde quando a enxergamos pela primeira vez e, talvez, conseguir tocá-la, quando por nós passar. Fui tola, ao tentar prender em mim pessoas que, por serem pesadas, me puxavam para o fundo, ainda luto todo dia para não voltar lá e tentar salvá-las (porque não querem sair do barro fértil que fecunda o solo.) Todo dia, dedico parte do meu tempo com atividades mil para não lembrar, para não chorar minha incapacidade de deixar fluir... e o quanto perdi enquanto agarrava o que me traz morte? Não vi. Mas sei que foi muito, e nada volta, nada... (mais uma metáfora boba...)
Ao fim, te digo apenas que a gente tem o poder de fazer a nossa vida dar certo. Por isso, deisitir é para os fracos e oprimidos. Os fortes, mudam de opinião e não se lembram mais do que eram antes.
Até!


sábado, 2 de julho de 2011

VOuAR

Olá, olha eu aqui depois de muito tempo para comentar sobre alguns dos muitos textos que publicou aqui. Sei que tem levado isso praticamente só, ou melhor, você tem levado nosso lugar sozinha, tem tirado o pó e as aranhas quando parece estar abandonado e eu tenho acompanhado isso, de longe, mas perto ao mesmo tempo. E cá estou para tirar um pouco do pó e dar um pouco da minha presença a esse lugar que construiu para que não ficássemos tão distante um do outro como estávamos. Então deixe que eu comente algumas coisas.
Confesso que as vezes me olho preso naquele banco, mas não estou mais lá como você disse anteriormente. Por incrível que possa parecer, você ainda meche comigo. Não deveria ser assim, mas poderia facilmente dizer que o que senti por você foi algo tão diferente que nunca senti por ninguém algo semelhante, sem ser demagogia ou algo que o valha. Foram momentos intensos em vivemos algo sem se importar com os demais e, quando começamos a se importar foi o que fez acabar.
Não precisa se confundir com pensamentos e ideias de que me faz sofrer, em momento algum me fez sofre, talvez tenha me entristecido de alguma forma, mas nem me lembro mais. Tudo ficou para trás.
Fico feliz que você escute Teatro Mágico e tenha um pingo de mim lá. São tantas lembranças que já havia esquecido. Meio-fio, faculdade e tantas outras coisas que já citou até aqui já estavam em meu baú do esquecimento que você tem a chave para abri-lo e me fazer lembrar de tantos momentos verdadeiros, alegres e tristes, de beijos, carinhos e abraços, de mãos que tocaram, apertaram e formaram um coração um dia.

Não deixe de ir aos seus encontros, por mais vãos que sejam. São instantes que moldam e mudam nossas vidas. Sei que há muita metáfora no que escreve, mas mesmo na metáfora há realidade. Por mais que cai várias e várias vezes, sabe onde me encontrar, sabe onde sempre haverá uma mão estendida para te ajudar a levantar, enxugar suas lágrimas e com um sorriso no rosto para motivá-la. É, esse sou eu. Aquele amigo que você sempre teve, mas esqueceu que existe.
She will be loved? É, realmente ela foi amada, é amada e sempre será... Basta acreditar. Não me recordo se foi em uma das nossas saídas para uma igreja na samamba que embromei ela a você, ou ainda, se fui em quem a cantou. Essa música por muito tempo foi o hino meu e dos meninos e também uma pergunta quando alguém começava a namorar. Era estranho isso, mas era bem legal...
Me desculpe pelos erros que com certeza houve no texto. Escrevi de uma vez – em duas fazes, sendo que quando escrevi a segunda, não li a primeira – para não ter mudanças de pensamentos.
E depois de tudo o que escrevi, acredito que hoje permito-me voar novamente e olhar somente ao longe aquele banco onde fiquei por algum tempo. Estarei por perto caso deseje voar comigo, mesmo que por um período, por brincadeira ou só para matar a saudade.





domingo, 26 de junho de 2011

Porque não como coração de galinha


Semelhante ao hábito de comermos coração de galinha, os gigantes comiam coração de humanos. Da mesma forma, eram petiscos deliciosos, se acompanhados por uma cerveja ou ice ou se devorados com arroz branco.  Para eles, assim como para nós, não importavam os sentimentos que pulsaram por algum tempo dentro desses coraçõeszinhos. Espera um pouco, mas o que é isso que digo? Seres humanos não podem ser comparados com essas galinhas brancas e gordas de granja, muito menos, com as magricelas criadas soltas no quintal, afinal, o que pulsa em nós é amor, carinho, solidariedade, compaixão ou, até mesmo, fidelidade. Não, não podia ter-nos comparado à elas, jamais. E assim pensavam os gigantes enquanto ainda éramos selvagens, "não podemos domesticá-los, olhem só: vivem em harmonia..." Mas o dia chegou em que houve guerras, e mortes, muitas mortes, e um queria ser melhor do que seu irmão. "Prenda-os!" Assim, pouco a pouco, deixamos de lutar contra as grades, as redes, os ferrolhos, os grilhões. Procriamos, morremos, cantamos, enfim, a vida agora era aquilo ali e já não mais se contavam estórias dos tempos de liberdade nem dos de dor. E de tanto que crescemos, submissos, fomos soltos nos quintais e já passeávamos pela casa, sem ofender aqueles que nos salvaram de nós mesmos. Até que um dia, por não haver o que comer, pegaram o primeiro de nós e, da carne imprestável, restou-lhes um coração delicioso, se servido como petisco ou se comido com arroz branco, no churrasco. Nosso destino finalmente revelado: servir à quem vence nossos corações cansados. Todos os dias, centenas se davam ao machado, ao fio de nilon, ao facão, à liberdade. E nossos filhos e netos aprenderam que nasciam para, um dia, serem servidos à mesa, um final glorioso e digno de quem mais comesse, mais crescesse, mais se atirasse na frente da navalha. Centenas, milhares... e continuávamos reproduzindo, procriando para um único fim: a boca gulosa do gigante que nos salvou de nós mesmos, um dia. Já não se amava mais, não se conhecia o pranto desesperado da mãe que perde o filho ou a gargalhada do pai que vê seu rebento pela primeira vez. Por não sermos mais humanos, mas galinhas criadas soltas na roça, atrofiamos o coração e a mente. Nascíamos e morríamos sem termos sentido medo, prazer, tristeza, mágoa. E quando por fim nosso peito se tornou oco, ficamos sem serventia e os olhares esfamiados se voltaram para as aves (avestruz, ema, garça...). Fomos expulsos das cozinhas, das árvores, dos sofás, daquilo que praticamnte já era considerado lar, para de onde viemos. Sem instinto, sem ajuda, mas principalmente, com um vazio dentro do peito. De volta ao ponto de partida, no início, vivíamos ainda como bicho de quintal, esperando a comida, esperando a morte. Com o passar do tempo, nos demos conta de nossa real condição de libertos e começamos, assim, a viver. Sobe em meu colo, atrapalhando-me a terminar essa lenda, em uma posição quase suicida, uma galinha. As criamos soltas pela casa, damos-lhes comida e, no cair do dia, arrancamos dezenas de coraçõeszinhos ainda pulsantes de seus corpos. Quais sonhos trariam? Nossos olhos gulosos não nos permitem tais reflexões.  

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Trecho I de O Encontro marcado, de Fernando Sabino



"Olhem: comunico-lhes, solenemente, que está fundado o terrorismo.
Base do novo movimento: preconizar e difundir o terror, de todas as maneiras, em todas as suas manifestações. O Terror nas Letras, cujo protótipo seria a novel 'Metamorfose', de Kafka.
 - Kafka era um terrorista. Incentivar todas as situações terroristas, estabelecer o pânico, lançar o terror.
- E a solução?- perguntou Mauro.
- A solução é a conduta católica- respondeu o amanuense Belmiro.
- A solução é o próprio problema, sabe como é? Não há solução. Imagino a seguinte cena: um congresso de sábios, os mais sábios do mundo, que se reuniram para resolver o problema dos problemas, o problema transcedental, o Problema, tout-court.
- O problema o quê?
- Tout-court. Vá à merda.
- Ah, tout-court. Merci.
- Pois bem: estáo reunidos, os sábios, a postos para começar a trabalhar, encontrar a solução do problema e o Presidente do Congresso dá por iniciada a sessão, anunciando que vai, enfim, dizer qual  é o Problema que os reuniu. Faz uma pausa, e declara solenemente: 'Meus senhores! O problema é o seguinte: Não há problema!'
- E daí?
- Daí os sábios terem de resolvero problema da inexistência do problema. É o terror.
- Confesso que não entendo.
- Vocês não entendem porque são burros: no nosso caso, é a mesma coisa. Só que há o problema, o que não há é a solução. Logo, está solucionado.
- E qual é o problema?
- O problema é o terror.
- Ah!
Calaram-se, os três, e riram, deslumbrados à ideia de que agora sim, setavam completamente doidos- os pais tinham razão.
- Es una cosa terrible, la inteligencia!
- Unamuno não era terrorista.
Dê três exemplos de situação terrorista.
- Um grito dentro da igreja, uma gargalhado no velório, um árabe no elevador.
- Muito brando. É o que se pode chamar, apenas, de 'terrorismo cor-de-rosa'. O verdadeiro terrorismo é o absurdo mais terrível, por exemplo: o do homem que se apaixona por um fio de cabelo da amada, e quer viver com ele, dormir com ele, ter filho com ele...
- É, meus amigos, o inevitável aconteceu.
- Bom lema para o terrorismo: O inevitável aconteceu! Se considerarmos o aconteceu, aí, como substantivo e não como verbo.
- Precisávamos é de uma coisa para símbolo.
- A coisa- prosseguiu Eduardo- A Coisa é o símbolo. Ninguém sabe o que é. Está em toda parte e não está em lugar nenhum. Assume todas as formas. Pode ser um sentimento, um objeto, uma cor- só tem que ser coisa, isto é: um substantivo. Por isso concluímos, há pouco, que aconteceu nçao era verbo. Onde a Coisa estiver, aí estará o terror.
Os outros ouviam, um tanto apreensivos. Eduardo falava sem parar:
- Me lembrei de uma coisa inventada por Salvador Dali- a Coisa era um pão. Sairia no jornal como manchete assim: 'O Inevitável Aconteceu- A Descoberta do Pão.' Um pãp monumental exatamente igual a um pão francês comum. A diferença estaria no tamanho: mediria dois metros de comprimento. O pão era encontrado na rua, levariam para a polícia. Estará envenenado? Conterá explosivo? Propaganda política? Os comunistas, o pão-para-todos? Anúncio de padaria? Os jornais comentavam e discutiam o que fazer do pão. Era só o assunto ir esfriando, e um pão maior ainda, de cinco metros, amanheceria atravessado no viaduto. Toda a cidade empolgada com o mistério, a polícia desorientada, o pão analisado nos laboratórios. Econtinuava o problema: o que fazer com ele? Para despistar, um  de nós escreveria um artigo sugerindo que fosse cortado em milhares de pedaços e doado à Casa do Pequeno Jornaleiro. No Rio, em São Paulo, Recife, Porto Alegre começavam a aparecer pães, cada vez maiores, nos lugares públicos. Eram membros de uma sociedade secreta já fundada, a Sociedade do Pão, que começava a trabalhar. E um dia surgiria outro pão gigantesco em Roma, outro em Londres, outro em Nova Iorque. A humanidade deixaria de se preocupar com seus problemas, as guerras seriam esquecidas, até que se resolvessem o mistério do pão. Era a vitória pelo Terror.
- Você já penso no tamanho do forno para assar esse pão?
- Isso não é problema para nós: a ideia é de Salvador Dali, que aliás, é um vigarista.
- É uma besta.
- Falso terrorista
- Abaixo Dali!"

(trecho retirado de O Encontro Marcado, cap.A Geração Espontânea, p. 67-69, 45ª ed 1984)

De uma carta de Hélio Pellegrino à Fernando Sabino

"O homem, quando jovem, é só, apesar de suas múltiplas experiências Ele pretende, nessa época, conformar a realidade com suas próprias mãos, sevindo-se dela, pois acredita que, ganhando o mundo, conseguirá ganhar-se a si próprio. Acontece, entretanto, que nascemos para o encontro com o outro, e não o seu domínio. Encontrá-lo é perdê-lo, é contemplá-lo na sua libérrima existência, é respeitá-lo e amá-lo na sua total e gratuita inutilidade. O começo da sabedoria consiste em perceber que temos e teremos as mãos vazias na medida em que tenhamos ganho ou pretendamos ganhar o mundo. Neste momento, a solidão nos atravessa como um dardo. É meio-dia em nossa vida, e a face do outro nos contempla como um enigma. Feliz daquele que, ao meio-dia, se percebe em plena treva, pobre e nu. Este é o preço do encontro, do possível encontro com o outro. A construção de tal possibilidade passa a ser, desde então, o trabalho do homem que merece o seu nome."

sentados: Fernando Sabino e Otto Lara Rezende; em pé: Hélio Pellegrino e Paulo Mendes Campos  

Trecho de O Continente, de Érico Veríssimo

"Diante daquele túmulo, naquela manhã de princípios de novembro, achavam-se Pedro Terra, sua mulher Arminda e Bibiana, a filha co casal. De chapeu na mão, os cabelos grisalhos esvoaçando à brisa, Pedro olhava para a cruz e lembrava-se dum dia - havia muitos anos - em que tinham vindo enterrar naquele mesmo cemitério um dos habitantes do povoado que morrera com os intestinos furados pelas guampas dum touro bravo. Por sinal, o enterro fora numa tarde de soalheira medonha, e os homens que carregaram o caixão a pulso tinham as roupas ensopadas de suor. Ana Terra fizera questão de ir ao cemitério, apesar do mormaço, e Pedro, que conhecia a teimosia da mãe, sabia que era inútil contrariá-la. Ficara a velha à sombra dum cedro, no centro do cemitério, apoiada no braço do filho, e no momento em que baixaram o caixão à cova, ela murmurou:
- Meu pai e meu irmão foram enterrados no alto duma coxilha- mostrou-lhe as mãos murchas- Eu mesma enterrei os dois com estas mãos que a terra um dia há de comer... esta terra. - E apontava para o chão vermelho. - Quero ser enterrada aqui, meu filho, aqui debaixo deste cedro.
A terra cai sobre o caixão com um som cavo, quase musical.
- Não quero que ninguém chore- continuava a velha.- Não é preciso costurarem nenhuma mortalha para mim. Qualquer vestido serve. Mas quero que vosmecê prometa que  ninguém vai ver a minha cara no velório. Promete?
- Não diga essas coisas, mamãe- repreendia-a Pedro. Mas ela apertava o braço do filho, sacudia a cabeça completamente branca, sorrindo um sorriso em que a boca desdentada sugava os lábios, fazendo-os dobrarem-se sobre as gengivas.
-Promete?- insistia ela.- Promete?
Ele não teve outro remédio senão sacudir a cabeça e dizer "Prometo".
 - Está bem, meu filho. Eu também prometo uma coisa. Prometo nunca mais voltar depois de morta para trabalhar na roca, como minha mãe fazia.- Fez uma pausa, olhou fixamente para a cova e depois disse, rindo o seu riso guinchado: - Mas o hábito tem muita força. O melhor mesmo é você também enterrar a roca junto comigo. Assim eu livro a Bibiana da sina de trabalhar nela.
Agora Pedro olhava para a cruz e pensava nessas coisas. Pensava também na vida trabalhosa e triste que a mãe sempre levara e, erguendo os olhos para Bibiana, ficou a contemplá-la com uma mistura de carinho e pena. Que destino estaria reservado para aquela criaturinha de Deus? 

(Trecho extraído de "um certo capitão Rodrigo", 1997, p. 26 e 27) 

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Maroon 5, She will be loved


Cantaram para mim essa música há algum tempo, dentro de um carro... Eram bons aqueles tempos e não soube aproveitá-los.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Pensei que amava. Também imaginei ser amada e, por isso, continuava a pensar que amava. Hoje me disseram que não é amor o que trago no peito, é dependência. Sou dependente e pensei amar alguém. Meu peito se rasga em detalhes que nem eu mesma sei de onde vieram. Estou sempre perdendo partes por não prestar atenção em onde caem. Costumo cair o tempo todo. Talvez para ver quem se importa, ninguém nunca voltou por amor ou piedade. Continuo a cair o tempo todo. Meus olhos procuram a lua de dia ou de noite, e uma vez, lá na UnB, enquanto esperava um amigo sair do B.B., me supreendi ofuscada por um poste que sabiamente se passou por lua e ganhou um suspiro de amor. Nos postes da UnB se confunde a lua. Sorrio para não chorar, para não lembrar que tudo isso que faço hoje é para um outro, que não sou eu. Apoio a cabeça na mochila e vejo que não sou feliz, uma voz atenta quase grita por medo de eu me perder "não pára, não, Guinha!! Por favor, não pára, não..." Por ela prossigo. Pela amizade dela, volto todos os dias, porque fui cativada, porque fui chamada Guinha... Mas não é só por isso não, é também porque já choramos juntas, amamos o mesmo professor, participamos do mesmo grupo, falamos a mesma língua, sonhamos o mesmo mundo... ela é o filtro que me ensina a ser boa, que faz com que eu pense em estrelas risonhas antes de dormir... Ela é Sarah .(a menina do poema aqui debaixo ^^)..
Hoje, creio que pela primeira vez chorei de alegria por saber que tenho um amigo que olha nos olhos e responde a todas as perguntas, dolorosas ou não, pessoais demais ou não...o alívio foi tão grande que se transformou em lágrimas. Não sei quanto a ele, mas eu me sinto menos pesada um pouco. 
Olho meus olhos no espelho e vejo que consigo depender de mim por pelo menos um dia, mais um dia. Porque quero sentir por mim o que sentia por aquele que julgava amar, quero que  eu seja para mim o que ele foi. Sei que vou me decepcionar muitas e muitas vezes, que marcarei encontros vãos, pois não irei, que minha solidão será plena, que cairei várias e várias vezes ainda, mas se eu não voltar para mim, quem saberá que fiquei para trás? Sinto uma certeza aguda de que dor alguma, um dia, me fará desistir, mas para chegar lá, preciso aprender com minhas fraquezas, mentiras, carapuças, senão serei sempre a mesma. Não mudar é ficar 1000 anos mais velho a cada hora, é já ter morrido e não saber, por isso mudo 1000 vezes por dia, troco de opinião, de time, tento me encontrar nas mentiras que conto, nos sonhos-pesdelos que tenho, faço a lição de casa antes de me deitar para brincar, a noite inteira, caso consiga.
E não importa o que eu faça, trago no peito a certeza de é amor, sim. 


sexta-feira, 20 de maio de 2011

Homenagem à Sarah (Salinda, para alguns...)



O RATO E A COMUNIDADE

1

O rato apareceu
Num ângulo da sala.
Um homem e uma mulher
Apareceram também,
Trocaram palavras comigo,
Fizeram diversos gestos
E depois foram-se embora.

? Que sabe esse rato de mim.
E esse homem e essa mulher
Sabem pouco mais que o rato.


2

Passam meses e anos perto de nós,
Rodeiam-nos, sentam-se com a gente à mesa,
Comentam a guerra, os telegramas,
Discutem planos políticos e econômicos,
Promovem arbitrariamente a felicidade coletiva.
Conhecem nosso paletó, camisa e gravata,
Nosso sorriso e o gesto de mover o copo.
Têm medo de nos tocar, não conhecem nossas lágrimas.
? Que sabem do nosso coração, do nosso desespero, da nossa
[comunicabilidade.
Que sabem do centro da nossa pessoa, de que são participantes.
...Subúrbios longínquos, esses homens.


3

Entretanto cada um deve beber no coração do outro.
Todos somos amassados, triturados:
O outro deve nos ajudar a reconstituir nossa forma.
O homem que não viu seu amigo chorar
Ainda não chegou ao centro da experiência do amor.
Para o amigo não existe nenhum sofrimento abstrato.
Todo o sofrimento é pressentido, trocado, comunicado.
? Quem sabe conviver o outro, quem sabe transferir o coração.
Ninguém mais sabe tocar na chaga aberta:
Entretanto todos têm uma chaga aberta.



4

Desconhecido que atravessas a rua,
? Que há de comum entre mim e ti.
A mesma solidão e a mesma roupa.

Procuras consolo, mas não podes parar.
És o servo da máquina e do tempo.
Mal sabes teu nome, nem o que desejas neste mundo.
Procuras a comunidade de uma pessoa,
Mas não a encontras na massa-leviatã.
Procuras alguém que seja obscuro e mínimo,
Que possa de novo te apresentar a ti mesmo.


5

A mulher que escolhemos, a única e não outra
Dentre tantas que habitam a terra triste,
Esta mesma, frágil e indefesa, bela ou feia,
Eis o mundo que nos é de novo apresentado
Por intermédio de uma só pessoa.

Esta é a que rompe as grades do nosso coração,
Esta é a que possuímos mais pela ternura que pelo sexo.
E nada será restaurado no seu genuíno sentido
Se a mulher não retornar ao seu princípio:
É a máquina instalada dentro dela que deveremos vencer,
Quando esta mulher se tornar de novo submissa e doce,
Os homens pela mão da antiga mediadora
Abrirão outra vez um ao outro os corações que sangram.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Um fato e algumas Conclusões


FATO: todos os anos, as lâmpadas dos postes são trocadas,por mais que estajam funcionando perfeitamente. Ano passado, como ocorre em muitos deles, havia um ninho entre a lâmpada e a proteção do poste. Quando esta foi retirada, o ninho caiu. A lâmpada foi trocada. Depois de alguns minutos, entretanto, duas andorinhas voavam alvoroçadas de um lado para o outro, dando rasantes e subindo alto, alto... Era o ninho delas que estava no chão. Além disso, era o ovinho delas que estava quebrado.

CONCLUSÃO 1: De que era feito o ninho, não me atentei, mas sabia que muitos daqueles gravetos vieram de longe, eram pesados e coloridos. Também sabia que o ninho é muito mais do que um porto seguro para onde se pode voltar todos os dias, é quente e possui o cheiro que todo lar de verdade tem: suor misturado com saliva, com lágrima, com farelo de comida. Quantos de nós sabemos ser ninho para o estranho que perambula ao nosso lado? (nossos pais, nossos amigos...) Quantos o querem ser, mas não sabem como sê-lo? DICA: precisa-se de gravetos de muitos lugares diferentes; de muita saliva para colocá-los juntos e sem brechas, por onde o frio não mais entrará; de um lugar seguro para que, quem veio, possa voltar sem erro e para que, quem virá, chegue transbordante por não ter errado o caminho. Mas ser ninho não é apenas construir um comôdo no peito e dizer "há vagas", tem de mostrar o coração pulsando, oferecer um pouco de seu próprio sangue e não desistir jamais daquele que veio sem saber como pedir ajuda. É essa a diferença de um ninho bom para um não-tão-bom-assim: saber sofrer junto, saber carregar a mesma dor pelo tempo que for necessário, saber amar sem pedir amor, cuidar sem querer cuidado... CUIDADO: não confundir ninho com porto. O ninho é caloroso e sempre dá vontade de voltar quando estamos longe, tem nossos gostos espalhados por cada pedacinho e nunca nos sentimos sós, e sentimos tanta paz que não sabemos se dormimos ou choramos de alegria. O porto é frio e indeferente, recebe a todos da mesma forma e nunca se deixa mudar por quem passa. Os ninhos não-tão-bons-assim tendem a se tornar portos ao passar do tempo, por inexperiência ou frustração, quem sabe?

CONCLUSÃO 2: não devemos temer a queda, pois somente nós mesmos podemos nos derrubar, da mesma forma que somente nós podemos nos fazer do melhor que a vida oferece, para darmos o melhor àqueles que nada tem. Quem escolhe ser ninho deve ter sempre em mente que o trabalho não cessa, que há de se ter em mãos, a qualquer hora, palavras de consolo e de exortação, de carinho e de bronca, que nossos lábios não proferirão, em tempo algum,  injúria, nem nosso olhar será  indiferente ou cruel (por mais odiosas que sejam as palavras de quem veio até nós), que nosso coração olhará na alma do outro e compreenderá sua dor, escolhendo o amor à raiva. CUIDADO: ser ninho não significa ser ingênuo. Temos que tomar cuidado com aqueles maquinam nossa queda. 

CONCLUSÃO 3: Da mesma forma como as andorinhas voavam e revoavam sobre o ninho caído, quem decide ser ninho não pode desistir daquele que cai, que sofre, que jura a morte a todo instante. Se houvesse uma regra única seria: NUNCA DESISTA DE QUEM SOFRE. Pois somos o abrigo, mas também o abrigado, somos a força do fraco, mas nos alimentamos na força de alguém mais forte. A lém disso, não sabemso quando seremos derrubados, por isso ensinamos os outros a construir ninhos dentro de si, para serem fortes os que, um dia, foram fracos, para nos acolherem na nossa fraqueza de seres humanos.  

quarta-feira, 11 de maio de 2011

A Prosa Impúrpura do Caicó, Chico César



Ah! Caicó arcaico
Em meu peito catolaico
Tudo é descrença e fé

Ah! Caicó arcaico
Meu cashcouer mallarmaico
Tudo rejeita e quer

É com, é sem
Milhão e vintém
Todo mundo e ninguém
Pé de xique-xique, pé de flor

Relabucho, velório
Videogame oratório
High-cult simplório
Amor sem fim, desamor

Sexo no-iê
Oxente, oh! Shit
Cego Aderaldo olhando pra mim

Moonwalkmam

terça-feira, 10 de maio de 2011

Blue, Leigh Nash


Everything is green, everyone is blue, and me too
Be careful for what you dream, 'cos my dream was you
And you came true


I tried to know you, but to know you, is to be blue
And I'm blue, and I'm blue

I'll say goodbye to me, I'll say goodbye to you, 'cos I can't move
The world won't bend, you know, for you to see the love, is worth all the trouble

I tried to know you, but to know you, is to be blue
And I'm blue, and I'm blue

[There is a dream that I can't fit in] There is a dream that I can't fit in
A lead that I can't fill, all of my hopes have been diminished, you're not having it, I'm trying to give, oh

I tried to know you, but to know you, is to be blue
I said goodbye but I'm still in love with you
And I'm blue, and I'm blue

domingo, 8 de maio de 2011

Quando tudo passa... não deixa rastros

Bem, sem música ou poema não há beleza no dia. Minhas impressões não contam e me pediram para não escrever diários, não mais. Sinto que ainda responda no meu tempo, que ainda faça o que é preciso quando entendo que a hora é a certa, me disseram que se chama "respeito", e no meu caso é egoísmo. Não posso te dizer: "nada disso é para você", estaria mentindo. Mas dizer "tudo é porque ainda me importo" também seria mentira. Afinal, você faz parte da minha vida, menos intensamente agora, porém está escrito no livro que trago no peito A2 em algum lugar... 
Meu único receio ao começar isso aqui era seus sentimentos, sabia que aconteceria, sabia que voltaríamos ao banco e não me importo de ir toda vez que você precisar, eles são importantes para mim, creia, só que eu fui embora e eu te disse adeus, para você não me esperar, talvez nunca volte, entenda. 
Você ainda me deixa confusa, mas não por viver a dúvida gosto- não-gosto, e sim por pensar faço-sofrer-não-faço-sofrer. Talvez você seja uma das únicas pessoas com quem me importa o estado do coração. Por amizade, preocupação... não posso dizer o motivo, não sei. Mas consigo saber que ouço O Teatro Mágico porque você me apresentou, que você foi o relacionamento mais sério que eu tive até hoje, que todo meio-fio me faz sorrir, que fico sem graça quando passo em frente a Anhanguera do Taguatinga Shopping. De tudo isso sei e guardo no peito, na lembrança, e também no esquecimento. Desculpe... você não faz idea do quanto eu gostaria de gostar de você como sei que gosta de  mim... somente acredito que não escolhemos de quem vamos gostar, mas o tempo e a intensidade podem ser controlados. É o que me move, é o que faz com que eu olhe para frente depois de um amor frustrado ou interrompido ou simplesmente platônico. Não vivo mais amores impossíveis, nem sonho mais com os meninos do clubinho rival ao meu...
Vou acrescentar comentários às músicas, ás fotos e aos textos, mas eles ficam porque dizem o que sinto magnanimamente... ok?
=D
Te encontro por aqui e por aí, é só marcar...


sexta-feira, 6 de maio de 2011

Quando o amor se revela, Fernando Pessoa



Enquanto não superarmos
a ânsia do amor sem limites,
não podemos crescer
emocionalmente.

Enquanto não atravessarmos
a dor de nossa própria solidão,
continuaremos
a nos buscar em outras metades.
Para viver a dois, antes, é
necessário ser um.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

O que fazer agora?

Fico feliz que tenha ficado feliz em ler o meu texto por aqui, minha vida está numa corrida alta velocidade, mas acho que a partir de hoje deve ficar um pouco mais tranquila. Entreguei meu projeto de monografia quase que 100% finalizado, terei (assim espero) um pouco mais de tempo para escrever.

Confesso que as vezes penso que todos esses textos ou pelo menos trechos deles são indiretas pra mim, fico pensando, “cara, parece que ela ainda gosta de mim da mesma forma que gosto dela”. Mas não sei até onde isso é real ou imaginário, aliás, o que é real ou imaginário nas nossas vidas? Já tenho vivido grandes sonhos e tantos outros já abandonei que nem sei quando foi que fizeram parte de algum desejo meu.

As vezes penso em querer volta a viver aquele mundo imaginário que vivemos anos atrás, penso em correr atrás e fazer o possível para isso acontecer. Não sei até onde tenho forças para isso ou se você tem essa força.

Agora o que fazer? Quero continuar a escrever, ler o que escreve (gostaria que escrevesse e não publicasse sempre trechos alheios) pensar que são indiretas e continuar com isso que sinto a cada leitura, a cada palavra que leio e escuto a sua voz no meu inconsciente falando comigo. Seria isso loucura?

Vamos fazer disso um diário, escrever sobre nossas vidas, assim, não ficaremos longe um do outro e a distância é uma mera fronteira a ser quebrada, já que citei essa fronteira, há a possibilidade de sairmos nós dois?

Será que se lembra da música?



An!
Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. C. L.

terça-feira, 3 de maio de 2011

"Dói muito, mas eu não vou parar. A minha não-desistência é o que de melhor posso oferecer a você e a mim neste momento." Caio Fernado Abreu

Não sei quanto tempo faz desde nossa últma conversa, mas tanta coisa mudou... jamais saberia te contar todos os sonhos que tive, e que não se realizaram; todas as alegrias que vivi, e que não soube agradecer; todas as vezes que chorei, com e sem motivo aparente. Ouço música para disfarçar minha dor. Faço comida para ter desculpa para cantar. Vou à faculdade para ver gente e ouvir coisas que não entendo. Leio livros para me sentir viva. Me apaixono todos os dias por pessoas que admiro. Começo uma conversa por receio de parecer orgulhosa. Penso em tudo que fiz antes de dormir, mas meu último pensamento sempre é: "como será amanhã?". Visito a mesma sala de aula para lembrar um amigo. Corro de mim o dia inteiro e sento ao meu lado quando volto para casa. Me sinto ausente a maior parte do tempo. Abraço bem apertado para a pessoa se sentir querida, talvez seja o único momento do dia em que ela se sinta assim. Tomo sorvete para escapar da tristeza que, de vez em quando, cola em mim que nem chiclete. Banho demorado para sentir molhar a alma. Sorrio de canto de boca para lembrar o bebê. Conheço um menino chamado Sejoga que vende bombom. Vivo me perguntando "agora?... agora?... agora?" para que algo aconteça enquanto espero (mas Clarice diz: "não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue"). Quero, ainda que por teimosia, uma flor na minha janela, uma carta no correio, um dia nublado pra ler Neruda. Além disso, quero um pudim na geladeira e alguém em quem eu possa pensar o dia todo, sem culpa, sem alegria, sem amor ou desesperança. (Ouço a Fátima Bernardes e parece que ela diz: "ó páqui". Ilusão). 
Gosto de você. Me sinto tão triste hoje, como alguém que de repente percebe a morte do filho. Mas quem morre em mim todo o dia? E quem renasce? Por que vou, se sei que volto sempre ("vou voltar, haja o que houver eu vou voltar, já te deixei jurando nunca mais olhar pra trás, palavra de mulher, vou voltar...")? A expectativa do Dia Novo me exaspera e me faz sonhar coisas loucas, como aquela mulher, cuja profissão era sonhar, que um dia conheceu Neruda que sonhou que ela sonhava com ele. Depois foram descobrir que ela também sonhara que ele sonhou com ela. Acordo. Não há nada de novo debaixo do céu, nem dentro do coração do homem. O Dia Novo não veio. E o que importa? Esperar já não espero. Sigo com aqueles que, por sentirem a garganta seca, de repende percebem que estavam boquiabertos ante o deslumbrante fremer da vida.




No Dia em que Ele foi Embora, Chana de Moura


Recordo-me claramente daquela madrugada. Eu já não pegava no sono há duas noites, pouco dormia desde que descobrira o seu segredo. O que viria depois? Levantou-se lentamente, calçou as botas sem preocupar-se em recolher os pertences espalhados pela casa. Percebi que tentou ousar um sutil e carinhoso toque em meu corpo. Em um seguinte gesto de mero carinho, cobriu-me com a coberta. Sua redenção. Eu carregava a certeza de que não estava partindo por não mais me desejar. Porém, nem toda certeza conforta o coração da gente. Abriu a porta lentamente e por ali nunca mais voltou. Nunca mais o vi. Nunca mais nos veríamos. Nunca mais nos vimos. Nunca mais. Nunca. Permaneci em silêncio sôfrego presenciando a cena diante da escuridão do quarto. Quando percebi sua distância, levantei e caminhei até a janela, observei friamente seu vulto atravessar a rua lá embaixo, dotado de uma pressa incomum, a pressa de se ir para lugar algum. Para se ir embora de si mesmo, era uma fuga. Não cedi. Não cedi a ele, nem cedi à decepção, nem cedi à eu mesma, enlouquecendo por dentro. Notei uma carta em cima de seu travesseiro ainda aquecido por seu corpo quente, nenhuma dor ou rancor havia em meu peito. Sem entender ao certo e sem apresentar resistência ao acontecido, abri e iniciei a leitura daquele bilhete escrito a seu próprio punho. A carta não indicava o destinatário e nem, sequer, o remetente, poderia ser endereçada à qualquer pessoa. Porém, era endereçada, eu sabia, a mim. E havia sido escrito através de suas mãos, através das mãos que eu ainda posso recordar. Ele escreveu:

"Eu gosto de você. Meus 850 anos passaram a possuir algum resquício de sentido desde o momento em que dirigi a palavra a você pela primeira vez. Porque eu gostei de você desde aquele dia, desde o sempre, desde o nosso sempre. Gosto de você e das suas mentiras. Na realidade, não sei ao certo se aprecio mais aquilo que você forja ser ou sua devoção ao parecer ser este outro alguém. Você é meu camaleão de rebeldia conformada a tombar somente impérios já massacrados. Você. Gosto da sua fúria contida entre um beijo e um abraço e entre a sua própria vontade. Gosto desse seu circo onde não há alegria de palhaços, desse seu carnaval sem lantejoulas e samba, e gosto de a ver quando dança sozinha na sala, pensando que não a estou observando, ao som de música alguma. Seu dançar é um poema, meu amor. Mas meu gostar é gélido.

Você possuí um bocado de sonhos possíveis, mas, ao menos, ainda sabe como sonhar. Seu desejo maior é jamais parar de sonhar. Eu a conheço, um pouco.

Me convoca a imaginar. Você nasceu somente metade. Uma metade nascida para que eu pudesse a completar. E a transbordar. Sua loucura é tão calculada, e seu passo é quase sempre errôneo. Você nem tem tanta força nem tanta alegria, mas você é aquilo que nasceu para ser. E com tamanha coragem, o é. Eu nasci para ser, mas jamais batalhei em meu nome. Jamais me olhei perante um espelho. Desisti. Como fiz inúmeras vezes antes, desisti. Desisti imaginando que o coração se acalmaria aos poucos, com o passar dos séculos.

Quando o tempo se fez negro, você, que é fraca, alcançou a luz. Quando despenquei ao fundo de um poço, eu, que sou forte, cruzei os braços e, solitário, chorei.

Gosto porque você não é e nunca será uma rainha, uma condessa ou uma nobre dama da sociedade. Eu gosto de você pois é, entre tantas, a mais mulher de todas. A única que capaz de em mim chegar. Gosto de você por cada um de seus encantadores defeitos que, de tanto amor, eu transformei em qualidades.

Gosto de você tanto quanto é preciso gostar para o poder chamar "amor". Eu amo você tanto quanto se pode amar alguém que não a gente mesmo, e espero que isso baste para você me entender agora.

Você está acordada ao meu lado neste exato momento, fingindo dormir. Olhos arregalados percorrendo cada centímetro desta parede vazia. Está terrivelmente assustada. Eu estou mais. Posso te ver, meu amor. A parede não responderá suas perguntas, as nossas perguntas. Tampouco eu. Tampouco você. Tampouco vida porque esta ditadora dispensa a explicação. Devemos aprender por nós mesmos.

Gosto do jeito com o qual me olha, como se fosse eu todo o mistério sagrado contido em seu infanto olhar. Não há nada de novo em mim, a não ser você que será sempre meu futuro e meu passado de agora em diante.

Por quê? — Eu pergunto. Por quê? — Você pergunta.

Os homens são sempre covardes, agora chegou a minha vez. Por isso, vou partir.

A vida agraciou-me com a força de poder suportar a eternidade de uma vida, mas não concedeu-me a força de suportar a perda de um amor.

Eu não sei. Você não sabe. Nós não sabemos. Nunca saberemos."




segunda-feira, 2 de maio de 2011

As time goes by, Luis Fernando Veríssimo

Conheci Rick Blaine em Paris, não faz muito. Ele tem uma espelunca perto da Madeleine que pega todos os americanos bêbados que o Harry’s Bar expulsa. Está com 70 anos, mas não parece ter mais que 69. Os olhos empapuçados são os mesmos mas o cabelo se foi e a barriga só parou de crescer porque não havia mais lugar atrás do balcão. A princípio ele negou que fosse Rick.

- Não conheço nenhum Rick.

- Está lá fora. Um letreiro enorme. Rick’s Café Americain.

- Está? Faz anos que não vou lá fora. O que você quer?

- Um bourbon. E alguma coisa para comer.

Escolhi um sanduíche de uma longa lista e Rick gritou o pedido para um negrão na cozinha. Reconheci o negrão. Era o pianista do café do Rick em Casablanca. Perguntei por que ele não tocava mais piano.

- Sam? Porque só sabia uma música. A clientela não agüentava mais. Ele também faz sempre o mesmo sanduíche. Mas ninguém vem aqui pela comida.

Cantarolei um trecho de As Time Goes By. Perguntei:

- O que você faria se ela entrasse por aquela porta agora?

- Diria: “Um chazinho, vovó?” O passado não volta.

- Voltou uma vez. De todos os bares do mundo, ela tinha que escolher logo o seu, em Casablanca, para entrar.

- Não volta mais.

Mas ele olhou, rápido, quando a porta se abriu de repente. Era um americano que vinha pedir-lhe dinheiro para voltar aos Estados Unidos. Estava fugindo de Mitterrand. Rick o ignorou. Perguntou o que eu queria além do bourbon e do sanduíche do Sam, que estava péssimo.

- Sempre quis saber o que aconteceu depois que ela embarcou naquele avião com Victor Laszlo e você e o inspetor Louis se afastaram, desaparecendo no nevoeiro.

- Passei quarenta anos no nevoeiro - respondeu ele. Objetivamente, não estava disposto a contar muita coisa.

- Eu tenho uma tese.

Ele sorriu.

- Mais uma...

- Você foi o primeiro a se desencantar com as grandes causas. Você era o seu próprio território neutro. Victor Laszlo era o cara engajado. Deve ter morrido cedo e levado alguns outros idealistas como ele, pensando que estavam salvando o mundo para a democracia e os bons sentimentos. Você nunca teve ilusões sobre a humanidade. Era um cínico. Mas também era um romântico. Podia ter-se livrado de Laszlo aos olhos dela. Por quê?

- Você se lembra do rosto dela naquele instante?

Eu me lembrava. Mesmo através do nevoeiro, eu me lembrava. Ele tinha razão. Por um rosto daqueles a gente sacrifica até a falta de ideais.

A porta se abriu de novo e nós dois olhamos rápido. Mas era apenas outro bêbado.


(Este texto está nos livros Comédias da vida privada e A velhinha de Taubaté.)

"Cantiga para não morrer" e "Traduzir-se", Ferreira Gullar

Cantiga para não morrer
Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.

Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.

Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.


Traduzir-se


 Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.


Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.


Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.


Traduzir uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?