Não sei quanto tempo faz desde nossa últma conversa, mas tanta coisa mudou... jamais saberia te contar todos os sonhos que tive, e que não se realizaram; todas as alegrias que vivi, e que não soube agradecer; todas as vezes que chorei, com e sem motivo aparente. Ouço música para disfarçar minha dor. Faço comida para ter desculpa para cantar. Vou à faculdade para ver gente e ouvir coisas que não entendo. Leio livros para me sentir viva. Me apaixono todos os dias por pessoas que admiro. Começo uma conversa por receio de parecer orgulhosa. Penso em tudo que fiz antes de dormir, mas meu último pensamento sempre é: "como será amanhã?". Visito a mesma sala de aula para lembrar um amigo. Corro de mim o dia inteiro e sento ao meu lado quando volto para casa. Me sinto ausente a maior parte do tempo. Abraço bem apertado para a pessoa se sentir querida, talvez seja o único momento do dia em que ela se sinta assim. Tomo sorvete para escapar da tristeza que, de vez em quando, cola em mim que nem chiclete. Banho demorado para sentir molhar a alma. Sorrio de canto de boca para lembrar o bebê. Conheço um menino chamado Sejoga que vende bombom. Vivo me perguntando "agora?... agora?... agora?" para que algo aconteça enquanto espero (mas Clarice diz: "não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue"). Quero, ainda que por teimosia, uma flor na minha janela, uma carta no correio, um dia nublado pra ler Neruda. Além disso, quero um pudim na geladeira e alguém em quem eu possa pensar o dia todo, sem culpa, sem alegria, sem amor ou desesperança. (Ouço a Fátima Bernardes e parece que ela diz: "ó páqui". Ilusão).
Gosto de você. Me sinto tão triste hoje, como alguém que de repente percebe a morte do filho. Mas quem morre em mim todo o dia? E quem renasce? Por que vou, se sei que volto sempre ("vou voltar, haja o que houver eu vou voltar, já te deixei jurando nunca mais olhar pra trás, palavra de mulher, vou voltar...")? A expectativa do Dia Novo me exaspera e me faz sonhar coisas loucas, como aquela mulher, cuja profissão era sonhar, que um dia conheceu Neruda que sonhou que ela sonhava com ele. Depois foram descobrir que ela também sonhara que ele sonhou com ela. Acordo. Não há nada de novo debaixo do céu, nem dentro do coração do homem. O Dia Novo não veio. E o que importa? Esperar já não espero. Sigo com aqueles que, por sentirem a garganta seca, de repende percebem que estavam boquiabertos ante o deslumbrante fremer da vida.
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