Os últimos dias me asfixiam. Duas mãos grandes e apodrecidas me seguram pelo pescoço, forçam meu rosto para aquilo que finjo esquecer. Viajo em desespero para qualquer canto, me escondo dentro de qualquer abraço, mas entre um gemido e outro, vejo se aproximar mãos, olhos e boca. Algumas frases se descolam de minha pele e mais uma vez me aprisiono. Sua voz me afaga gentil e suave e me entrego às suas mãos frias e suadas. Qualquer palavra é gatilho apontado sob o queixo, qualquer descuido e me vejo em seu quarto, mexendo em caixa de sapato (tesouro velado). Creio que meu cansaço vem de vasculhar incessantemente cada dobra do blusão, para deixar ir verso, beijo ou fio de cabelo, vem do cuidado em não perceber as palavras se soltando lentamente, pêlo em flor desabrochada. Palavras suas, no seu tom de voz, no qual sou ninada antes de dormir, ao acordar, durante o banho e enquanto passeio pela cidade. Se algum dia chegarmos a conversar, me conta de novo suas aventuras com seu pai -- você me contou só uma vez, mas me pareceram legais.
Todo esse desabafo, esses posts sem sentido, são sempre a água podre que tiro do peito para não morrer afogada. Eu gostaria que meu coração estivesse do lado de fora, ou que fosse um blue bird fugitivo, ou até mesmo, forte e vigoroso, mas ele é mole, se doa a quem lhe oferece qualquer migalha de atenção. Ele escorreu para o mais fundo das minhas minas, cujas pedras preciosas já foram todas roubadas. Teria, por acaso, pensado ele, que poderia preencher todo o espaço vazio? Mas lá no fundo, mina água, vinda das lágrimas choradas por dentro e das feridas pusorentas e nunca cicatrizadas. Lá, meu coração-geléia se encharcou dessa substância tóxica e dela se viciou em tristeza. Ele soube ocupar todos espaços, borrando tudo de lilás e gris. Meu mole coração me incentiva a continuar a caminhada, mas cotidianamente escorrem duas ou três lágrimas de D. e ele se vê molhado por amor, na sua forma mais pura. Meu coração sorri e, por alguns minutos, se considera feliz.
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